O meu pai é um homem-pássaro é a história de um homem que queria voar. Queria tanto que deu asas à imaginação... e não só. Um dia, ele e a sua filha saltaram para o ar e bateram as asas para ganharem um prémio: seriam os primeiro a atravessar o rio Tyne a voar!
- David Almond é um autor britânico nascido em 1951. escreve para crianças e jovens adultos. Publicou a sua primeira obra em 1985. Recebeu vários prémios literários, entre estes o prestigiado prémio Hans Christian Andersen, de literaura infantil, em 2012.
David Almond, O
meu pai é um homem-pássaro, Editorial Presença, 2008
«Era uma manhã de
Primavera, como tantas outras, no n.º 12 de Lark Lane. Lá fora, os pássaros
chilreavam e piavam. O trânsito da cidade atroava e estrondeava e o despertador
de Lizzie tinia e retinia. Ela saltou da cama, lavou o rosto, esfregou bem
atrás das orelhas, lavou os dentes, escovou o cabelo, vestiu o uniforme
escolar, desceu, encheu a cafeteira elétrica, ligou-a, pôs pão na torradeira,
pôs a mesa com dois pratos, duas canecas, duas facas, leite, manteiga e geleia,
e depois dirigiu-se para o fundo da escada.
-- Pai! – chamou. –
Paizinho!
Nenhuma resposta.
-- Paizinho, são horas
de se levantar!
Nenhuma resposta.
-- Se não se lavar já
eu subo e...
Pisou ruidosamente o
primeiro degrau e, a seguir, o segundo.
--Vou subir! – gritou.
Ouviu um resmungo e um
gemido e, depois, nada.
-- vou contar até
cinco. Um... dois... dois e meio... Paizinho!
Lá de cima chegou um
grito abafado.
-- Espera aí, Lizzie!
Espera aí!
Ouviu-se um estrondo e
outro gemido e, depois, ali estava ele, mal ajambrado num velho roupão e
chinelos rotos, com o cabelo todo desgrenhado e a barba por fazer.
-- Desça, ande – disse
Lizzie.
Ele desceu aos
tropeções.
-- E não olhe para mim
dessa maneira.
--Não, Lizzie.
Com um puxão, ela
endireitou-lhe os ombros do roupão.
-- Olhe para si! Está
num bonito estado. Que diabo esteve a fazer lá em cima?
Ele sorriu.
-- A sonhar –
respondeu.
A sonhar! Que homem
este. Agora sente-se à mesa. Sente-se direito.
-- Sim, Lizzie.
Sentou-se na beirinha
da cadeira. Tinha os olhos brilhantes e entusiasmados. Lizzie encheu-lhe uma
caneca de chá.
-- Beba – disse, e ele
bebeu um golinho. – E coma essa torrada. – Ele mordiscou um vanto da torrada.
Coma-a como deve ser,
pai. – Ele deu uma dentada maior. E mastigue. Ele mastigou, durante uns
momentos. – E engula, paizinho. – Ele sorriu. – Sim, lizzie. – Deu uma grande
dentada, mastigou, engoliu e escancarou a boca para ela ver o seu interior.
- Engoli tudo. Estás a
ver?
Ela deu um estalo com
a língua e desviou os olhos.
-- Não seja tolo,
paizinho.
Endireitou-lhe o
cabelo e penteou-o. Endireitou-lhe a gola do casaco do pijama. Sentiu o
restolho denso da barba no queixo dele.
-- Tem de cuidar de
si. Não pode continuar dessa maneira, pois não?
O pai abanou a cabeça.
-- Não Lizzie. Com
certeza que não, Lizzie.
-- Hoje quero que tome
um duche, faça a barba e se vista como deve ser.
-- Sim, Lizzie.
-- Muito bem. E quais
são os seus planos para o dia?
Ele endireito-se na
cadeira e fitou-a.
-- Vou voar, Lizzie.
Como um pássaro.
A filha revirou os
olhos.
-- Ah, vai?
-- Vou, sim. E vou
participar no concurso.
-- No concurso? Que
concurso?
Ele riu-se,
inclinou-se para a frente e agarrou-lhe o braço.
-- O Grande Concurso
do Homem-Pássaro, evidentemente! Não ouviste falar nisso? Vem à cidade! Ouvi
dizer isso ontem. Não, anteontem. Ou naquele dia, fez na última terça-feira uma
semana. O que interessa é que o primeiro a atravessar o rio Tyne a voar ganha
mil libras. E eu vou concorrer. É verdade, Lizzie. É realmente verdade. Vou
ganhar! Vou, finalmente, mostrar o que valho.
Levantou-se, abriu os
braços e agitou-os como se fossem asas.
-- Os meus pés
levantaram-se do chão? - perguntou. - Levantaram-se? Os pés levantaram-se do
chão?
Correu
a agitar os braços, como se voasse.
– Oh, paizinho, não
seja pateta.
Lizzie correu atrás do
pai, que continuava a dar voltas pela sala. Conseguiu, finalmente, alcançá-lo e
voltou a alisar-lhe o cabelo e a endireitar-lhe o roupão.
-- Pois sim –
disse-lhe. – Talvez consiga voar como um pássaro, mas primeiro não se esqueça
de apanhar um pouco de ar e de comer um bom almoço, está bem?
Ele acenou
afirmativamente.
-- Pois sim, Lizzie –
concordou e, depois, agitou de novo os braços e deu uma pequena gargalhada.
-- Ah, a tia Doreen
disse que talvez passe por cá hoje.
O pai estacou. O seu
rosto desfigurou-se.
-- A tia Doreen ? –
perguntou.
Franziu o rosto e
suspirou.
-- Outra vez ela, não!
-- Sim, outra vez ela.
Vai fazê-lo regressa à terra.
Ele bateu o pé
esquerdo. E bateu o direito.
-- Mas, Lizzie… –
gemeu.
-- Nem mas Lizzie, nem
meio mas Lizzie. A tia Doreen gosta de si, como eu gosto. E preocupa-se
consigo, como eu me preocupo. Portanto, seja simpático com ela.
Os ombros dele
descaíram, e os braços penderam-lhe ao longo do corpo. Lizzie pegou na mala da
escola e deu um beijo no rosto do pai. Sorriu-lhe meigamente e abanou a cabeça.
Parecia um rapazinho, ali parado.
-- Que vou fazer
consigo?
-- Não sei, Lizzie –
murmurou ele.
Ela hesitou.
-- Não sei se devo
deixá-lo entregue a si próprio.
Ele riu-se.
Claro que deves. Tens
de ir para a escola, fazer as tuas contas de somar e os teus ditados.
Tinha razão. Ela
precisava de ir à escola. Gostava das contas de somar , dos ditados e das suas
professoras, assim como do diretor, o Sr. Mint, que fora tão bondoso para com
ela e o seu pai.
-- Está bem, eu vou,
Agora dê-me um beijo de até logo.
Ele beijou-a na face a
abraçaram-se. Depois, ela espetou o indicador:
-- Não se esqueça...
-- Está bem, Lizzie,
não me esqueço. Lavar-me. Fazer a barba. Comer um bom almoço. Apanhar muito ar.
E ser simpático com a tia D.
-- Muito bem. É isso
mesmo.
-- E não me esquecerei
de voar.
-- Oh, paizinho!
Ele pôs-lhe a mão nas
costas e conduziu-a à porta.
-- Vai – disse-lhe. –
Não precisas de te preocupar com coisa nenhuma. Anda, vai para a tua linda
escola.
Ela abriu a porta e
saiu para o jardim. Lançou-lhe um último olhar.
-- Adeus, Lizzie, até
logo.
Atravessou o jardim
até ao portão e saiu para a rua.
Parou um momento e
olhou para trás, para ele.
-- Vai, filha, eu estou bem.
Ela recomeçou a andar.
Ele acenou-lhe até a perder de vista e depois fechou a porta. Agitou os braços
a rir baixinho.
-- Pio, pio – disse. –
Tirou um pedaço de torrada debaixo da língua e cuspiu-o. – Pio pio – disse de
novo. – Pio pio, pio pio.
Depois viu uma mosca a
passear em cima da mesa.
Lambeu os lábios – iam, iam – e foi atrás dela.»
Para continuares a ler, requisita o livro na Biblioteca da tua escola.
Para continuares a ler, requisita o livro na Biblioteca da tua escola.
Paulo gosto do texto mas tens que alterar na linha 40 a palavra cebeça -cabeça e na linha 20 a contar de baixo despis que deve ser "depois, ela espetou o indicador".
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